Perdi alguma coisa


Eu perdi alguma coisa. Não se trata de um brinquedo, de uma vida na fase final de Sonic the Hedgehog ou uma noite de sono para assistir ao [triste] final de Dragon Ball.

Perdi justamente aquilo que me motiva a continuar na busca vã pela cabeça de um brinquedo.

Foi numa tarde, eu estava numa situação qualquer onde eu mesmo esperava agir de forma tal, mas por fim agi doutra maneira. Não que eu tivesse feito uma contravenção, muito menos um crime e/ou pecado, mas algo tinha mudado. Dessa vez eu percebi e imediatamente pus-me a pensar se outrora tinha feito. Sim. Tinha feito.

Mudanças não planejadas. Atitudes diferentes. Duas frases que são mais que o bastante para pôr qualquer leandro em pânico.

E ai? Sei que mudanças são necessárias blah blah blah, sobretudo depois dos tempos na Germânia. Mas essas mudanças sutis de atitude? Não sei se vale o esforço para ao menos tentar identificá-las ou se vou na onda do que eu mesmo me torno. Gosto muito duma frase de Raul, “o homem é o exercício que faz”, vamos me fazendo.

Sim o verbo está conjugado certo, vamos – eu nem ninguém se faz sozinho. Em maior ou menor grau somos todos influenciáveis e direcionados. Por exemplo, o Samurai Jack me influencia muito enquanto Maria de Schwarzburg-Rudolstadt¹ não me influencia quase nada.

Muito eventualmente, é a mudança à fase adulta se consolidando.

Vamos ficando mais velhos, nossa inércia aumenta. Nossos hábitos se reforçam. Perdemos a imortalidade da infância e a esperança da juventude (Time, do Pink Floyd, gera certo incômodo). Aprendemos que não podemos mudar o mundo nem nosso país. O sistema é muito grande, te moldou e te absorveu sem que você notasse.

Vamos nos definindo mais, perdendo coisas inúteis a nosso convívio. Perdemos pessoas, ganhamos pessoas. Acumulamos lembranças, fortalecemos nossos vícios. Vamos levando com a barriga até a natureza consumir tudo. E acima de tudo, ganhamos forças para continuar.

Eu desejo a mim e a vocês, leitores, muito, mas muito daquela coisa.

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¹ Se quiser saber mais, eis ai http://pt.wikipedia.org/wiki/Maria_de_Schwarzburg-Rudolstadt

 

Muffin do esquecimento


Hoje, dia 14 de janeiro de 2014, foi a primeira vez que comi muffin desde que estive na Finlândia, em março de 2013. Quase um ano sem provar essas maravilhosas criações do forno. Percebi isso quando estava no mercado, procurando algo para comer na hora do almoço – lembranças muito profundas me encharcaram nesse momento.

Hoje, como em algum dia de março/13, eu estava novamente passeando por um mercado a procura de iogurte e muffin, até os cheiros me pareceram ser iguais ao do círculo polar ártico (lembrando que março é frio pacas lá e janeiro é quente pacas aqui).

Aquela viagem foi única – em uma semana vivi duas pessoas diferentes, uma mais-que-feliz outra triste. Na verdade três, antes da Feliz veio a Esperançosa.

E o que isso tudo tem haver? Sobre essa deliciosa nostalgia, de tempos (e situações que nunca mais se repetirão) salpicados por aquela viagem à fria Helsinque, me veio a tona bons enxertos para um bom post- eu estava no banheiro escovando os dentes quando essa inspiração veio.

Ao tempo de voltar ao meu PC, tudo se foi, toda história traçada nas profundezas do meu cérebro foi-se, evaneceu-se como pó estelar – ficou apenas a lembrança no meu coração.

Então esse texto é sobre isso. É sobre todos os VÁRIOS temas que são germinados, fazem-se notar, têm algum brilho soturno, fugaz. E só. Somem onde nascem: Eu.

Não passavam de textos tímidos, medrosos de encarar o mundo. Ora, façam como seu autor, míseros textos, encarem-se. Se escrevo frases boas, elas vão. Se escrevo frases ruins, elas vão. Se escrevo frases medíocres, elas também vão. Eu confiava em vocês; talvez fosse VOCÊ, ô tema perdido, que me libertasse, que fizesse meu dedo literário florescer, que me desse orgulho.

Mas por medo vocês me deixaram. E vejam só, nem pelo abandono odeio vocês, ao contrário faço uma singela homenagem, com uma ideia que me é leal da cabeça ao editor de texto.

Infelizmente eu sei que aqueles temas, que por uma fração de segundo me deram grande regozijo, nunca mais voltarão a minha mente, a minha folha, ao meu blog.

Não adianta eu ficar agora me lamuriando, (a/i)molando minha tristeza. Eu, em meu humilde e simplório intelecto, só conheço uma saída para me livrar dessa dor: continuar andando, comendo muffins em novas cidades. Fazendo novas lembranças.

Soneto da doação


Dê-me seu sorriso mais amarelo

Dê-me sua dor mais aguda

Dê-me sua frustração mais plena

Aquilo que não mais aguenta

Dê-me sua saudade mais longe

Dê-me seu grito mais abafado

Dê-me suas pequenas angustias

Aquilo que não cabem às Augustas

Dê-me suas infelicidades

A preencher minha realidade

Dê-me a chama

De algo que clama

Dê-me todo seu perdão por este soneto em formação

Dê-me todo seu perdão por minha inexatidão

De fato não podem existir métricas ou rimas que meçam ou exprimam

a dor.

Um moribundo na boemia


Era uma vez uma região boemia de uma cidade alegre, cheia de pessoas de todas as crenças, raças e sortes. Era alta madrugada, fim de festa.

Era hora de aprumar-se à casa. Ao invés de pegar o primeiro táxi, deu preferência por caminhar pelas  as ruas antigas, com seus edifícios coloniais e suntuosos prédios governamentais, todos com lindas iluminações noturnas, coroados com a lua.

Nesse momento, imerso no silêncio filtrado da madrugada, ilhado nas suas próprias ideias, medos e amores, num compasso sem rumo na escuridão do Campo de Santana, na rigidez mecânica do relógio da Central, percebeu que o poeta tinha razão, e oras, ele sempre teve “a rua com a lua é bem mais formosa”.

Ao passar em frente ao Clube Elite, tomado por uma balada que parecia bem animada, completou sua catarse noturna. E na “cidade tão bonita, sobrou-lhe somente levar sua alma aflita e tentar acalmar as tristezas por onde passar, chorando seu ás.”

Mas pombas, “para que querer que um coração normal um dia vá te compreender” se nem mesmo tu te compreendes? Fale por você mesmo, autor sem sujeito.

Ao final, descobriu que a festa nunca termina, sempre haverá alguem para dançar e pular. Enquanto for noite há baile no Elite.

Não sabe se deseja morrer na noite de São Sebastião do Rio de Janeiro – tão gostosa-, mas alegra-se por tê-la vivido.

**–

A atmosfera filtrava e atenuava os sons; ao longo de seu torpe caminho escutava batidas eletrônicas, cuícas, vozes, cordas. E em sua mente cantava Noites Cariocas, Dama da Noite, As Rosas não falam, Recado ao Poeta, Maneiras e tantas outras músicas brasileiras, de compositores que fazem cintilar o céu das terras do Sul.

A mala em meu quarto


A 'Qualität' da Engenharia dificilmente se aplica as interações sociais do povo alemão.

A ‘Qualität’ da Engenharia dificilmente se aplica as interações sociais do povo alemão.

Num cantinho do quarto está a mala que eu trouxe cheia. Eu podia tê-la guardado dentro/em cima do armário ou debaixo da cama, mas sua presença serve para me lembrar que, embora esteja e hei de ficar um bom tempo aqui, eu não sou daqui. Meu lugar não é aqui.

Essa mala veio cheia de roupas, livros, quinquilhrias que poderão ser dispensados com algum grau de facilidade. Minha mente veio cheia de coisas que não podem ser jogadas fora. Minhas memórias, anseios, desejos, ao contrário, são sempiternos.

Esse post não poderia ter sido escrito noutro idioma. “A última flor do Lácio” é a língua que sou um fluente perfeito, a única em que posso fazer e entender todas as artimanhas literárias; habilidades que muito provavelmente eu nunca terei em outro idioma.

Passei uma semana na Dinamarca sozinho, uma semana sem falar a língua de Machado. Acreditem, foi angustiante.

No post de despedida eu disse que o blog seria a mais forte ligação entre mim e o Português. Não se mostrou bem uma verdade face a quantidade impressionante de brasileiros e alemães fluentes em português que encontrei na terra de São Beno.

Esse post não poderia ter sido escrito antes. Somente agora que as novidades já se tornaram rotina eu posso ter chances de reproduzir com certa fidelidade algumas das coisas diárias da vida na Alemanha. Não que a vida seja propriamente dificil ou fácil, é diferente.

Sair da zona de conforto, na qual vivi por 21 anos, exige uma enorme confiaça. Confiaça em mim mesmo, pois passo ser o maior agente que cuida de mim. Me pergunto se não demorei demais para tal.

Com alguma tranquilidade posso afirmar que construi uma nova (e muito diferente) zona de conforto. Minha rotina é estável, mas os riscos futuros que pretendo assumir são bem altos. Eu vou pagar para ver. Estou pagando e ganhando a banca, graças a Deus.

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A língua é apenas um entre vários fatores que definem a cultura dum lugar; por certo é o mais visível, que mais une, figura entre os mais importantes, porém não é único.

A grande sacada está em aprender a cultura sutil, aquela que não está nos livros, aquela que somente vivendo pode aprender (idioma eu posso aprender no meus país), como por exemplo saber a lógica das plataformas da estação de trem.

Nisso está a graça da vida, viver, vivendo, aprender, aprendendo, amar, amando, doer, doendo.

Nisso está a graça do intercâmbio, aprender vivendo, mesmo com uma mala te esperando.

Dos Desenhos


Não me lembro ao certo. Foi por volta dos 11,12 anos que li meu primeiro Machado, Quincas Borba, até hoje meu livro favorito. Me identifiquei com Rubião.

Rubião não tinha maiores ambições, mesmo assim a vida voltou-se contra ele. Um cara simples, um cara bobo, mas que um dia na ida para a Capital Imperial conhece algo que muda sua vida e o leva a loucura, o amor – fogo que arde sem se ver. Tantos Palhas passaram em minha vida, tenho Sofias que tanto me magoam. E tenho medo de morrer como ele, só, louco, rastejante. Mas cultivo o sonho de caçar borboletas com minha amada; nossa única ambição é o amor!

Tantos outros livros me tocaram, mas não é sobre eles que escrevo. Tantos filmes me tocaram, mas não é sobre eles que escrevo.

Não desejo fazer um tratado sobre como os livros moldaram-me. Mas sim os desenhos. Eu sempre li bastante porque sempre gostei. Tirei muito proveito de cada situação vivida nos livros. Sim‼ Vive-se a leitura! Contudo foram os desenhos que mais profundamente moldaram o carater, sonhos e esperança desse ser que vos escreve.

Fechando ainda mais o círculo, temos Digimon e Samurai Jack. E em última instância, Samurai Jack. Não vou contar sua história, uma rápida pesquisa no IMDB solveria sua dúvida.

Antes uma observação. Minha catequese, ao contrário que muitos pensam, teve menos influência sobre mim que qualquer outra coisa, o sentimento de pertencer a Santa Igreja só me veio com a Crisma – por isso sugiro vocês se crismarem também. Eu, de família católica, seguia todas as tradições do calendário, mas essas ‘obrigações’ não eram tão fervorosas. Ou seja, minha criação foi cristã mas não tão confessional como se costuma achar. Além da educação dos meus pais, eu como todos, tive um ‘complemento’: os desenhos. Onde voltamos para o tema.

Criado em apartamento, sem irmãos, primos ou amigos. Sozinho. Brincava sozinho. Estudava sozinho. Era feliz sozinho. Desenhos japoneses e americanos priorizavam pessoas felizes aos pares, trios, quartetos, enfim, nunca sozinhas, como eu. Mas eis que surge um valente guerreiro que solitariamente luta por seus ideais e crenças, faz o bem por onde passa, sofre terríveis dilemas morais, sente frio e dor, perde batalhas e conquista a glória! Até ai muito bonito, muito comovente. Mas uma criança já iniciada na realidade bruta, cruel e fria de Machado de Assis não pode esperar que um samurai com uma espada não espete seu inimigo. Jack o faz porque Jack é real!

Em alguns desenhos o heroi quiçá usa uma armas quanto mais mata alguém. Mas Jack é real mesmo sendo fictício. Jack inspira.

Ele luta contra um Mal bem definido que se expressa em sutis contornos humanos, nos quais a espada é enfiada. Jack vence.

Ele não é um matador sem propósito, um serial-killer. Apenas busca restaurar a Paz e prosperidade para seu povo, libertar os cativos da opressão. Jack é bom.

Ele não é uma máquina fria sem compromissos maiores, ele é fiel. Jack reza.

Ele não é um fanático por armas e destruição. Apenas usa sua espada, sagrada. Com ela vence todas as outras armas. Jack é samurai. Samurai Jack.

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Por fim, tenho moldado o meu heroi. Sua moral é adicionada no lugar onde já existia a educação de meus pais, onde depois viria os ensinamentos cristãos, onde depois – muito depois – viria os ensinamentos da amizade. Esse lugar podemos chamar de Leandro.

Uma peça desforme, definida, inacabada, humana. Eu.

Uma peça rara. Sem cara-metade. Eu.

Uma peça solitária em meio a multidão. Uma peça feliz em meio a poucos. Nós.

P.S.: Sem fundamentos sociais, teológicos ou de qualquer outra ordem, eu acredito que Machado de Assis e Luís Vaz de Camões tenham um lugar muito especial no céu. Afinal eles escreveram as mais magnânimas obras literárias da humanidade. Impossível não achar que contaram com ajuda lá de cima ao escrevé-las. E foram recebidos com festa! Evoé, Baco!

Príncipe Vegeta e Samurai Jack

Príncipe Vegeta e Samurai Jack, agentes ativos na hora de preencher o perfil do Facebook.

Um moribundo no trem


Era uma vez um trem na cidade do Rio de Janeiro. O trem ia para Central do Brasil. O trem estava cheio. Nesse trem cheio estava uma pessoa.

Era uma vez um trem na cidade do Rio de Janeiro. O trem ia para Deodoro. O trem estava cheio. Nesse trem cheio estava uma pessoa.

Era uma vez um trem na cidade do Rio de Janeiro. O trem ia para Central do Brasil. O trem estava vazio. Nesse trem vazio estava uma pessoa melancolica pois estava se lembrando do tempo que tinha muitas pessoas ao redor (mesmo que nem todas fossem amigas), do tempo que estudava perto de casa e não dependia do transporte público, do tempo que tinha notas altas, do tempo que tinha sérias discussões sobre plasma, guerras…

Essa pessoa também estava melancolica por perceber que sua permanencia no seu novo colégio (sim, o mesmo colégio que o fez perder todos os seus privilégios!) estava acabando. Tinha passado dois anos e meio num Centro de Excelência Tecnológica e se perguntava “e agora?”. Nesse Centro, tinha quase nenhum amigo, tinha notas baixas, era excluido, passado pra tras, humilhado. Mas foi também nesse Centro que o moribundo do trem conheceu a menina mais linda e perfeita que o mundo poderia gerar, mas a perdeu; nesse Centro conheceu dois amigos que se juntariam aos outros dois no Hall do Melhores.

A pessoa percebeu que sentia falta do tempo que era menor, tinha menos problemas. A pessoa tinha medo de ficar sozinha para sempre.

A pessoa fala que não adianta reclamar, diz que o importate é ter fé em Deus e seguir em frente. Novas coisas boas hão de vir.

A pessoa só tem medo de perder o último trem para Deodoro e ficar sozinha no Centro. Mesmo que o trem esteja lotado.